sábado, 8 de setembro de 2012

Guerra no Congo Afeta uma Geração de Crianças.

Os senhores da guerra mataram até mesmo a infância aqui.

À medida que milícias disputam o controle desta cidade provincial no Nordeste do Congo, os jovens de Bunia estão pagando um alto preço. A guerra fechou suas escolas, os deixou aleijados e famintos, matou seus pais diante dos seus olhos. Ela transformou as crianças em assassinas impiedosas e assombra suas lembranças com lesões que seriam impróprias aos adultos mais resistentes. Garotas foram estupradas, crianças pequenas foram chacinadas, um bebê foi abandonado chorando em meio a cadáveres.

Outro dia, enquanto um comboio de embaixadores do Conselho de Segurança da ONU cruzava a rua principal de Bunia para uma breve visita, um menino de 14 anos de olhar sério, chamado Jean de Dieu Udaga, estava parado diante de um hospital improvisado. Seus pais foram fuzilados diante dele no mês passado. Ele teve que fugir para salvar sua vida, com pernas cravadas de estilhaços.

Hoje, suas pernas estão quase curadas, mas só isto. Jean de Dieu, um dos inúmeros órfãos da cidade, não tem para onde ir além do colchão fino de espuma no chão do hospital -nenhum lugar exceto, como temem os defensores dos direitos das crianças, para os braços dos magros e pequenos soldados-crianças que desfilam por estas ruas com granadas de mão como brinquedos. Um deles, uma presença diária nesta rua principal, carrega seu arsenal mortífero em um mochila amarela brilhante com um personagem de desenho animado.

O que esta geração abalada poderá alguma dia provocar neste país é impossível de saber. Por ora, a questão nas mentes dos trabalhadores de direitos humanos é como e se é possível levar à justiça os adultos que violaram seus direitos. A delegação do Conselho de Segurança, em sua recente visita a Bunia, prometeu colocar um fim à impunidade dos violadores dos direitos.

Até o momento, a força de paz da ONU neste país tem conseguido fazer pouco para conter a violência. O Conselho de Segurança agora enfrenta a difícil questão sobre se fortalece o mandato da missão, que expira no final de junho. O Conselho tratará da questão em 23 de junho.

O fato de todos os países envolvidos na guerra que já dura 4 anos e meio neste país -o governo congolês em Kinshasa, assim como as vizinhas Uganda e Ruanda- terem ratificado a Convenção dos Direitos da Criança da ONU parece hoje uma abstração fria e cruel. Segundo a lei internacional, os líderes milicianos que recrutam crianças como soldados, para não falar daqueles que estupram e matam crianças, podem ser julgados como criminosos de guerra. Um relatório do secretário-geral da ONU apresentou 10 grupos armados diferentes neste país que estavam recrutando crianças como soldados.

"Nós torcemos muito para que os perpetradores da violência, independente de onde forem, paguem por isto", disse Kristine Peduto, uma conselheira de proteção à criança da missão da ONU em Bunia. "Aqueles que estão estuprando, aqueles que estão matando, aqueles que são responsáveis pelos abusos dos direitos humanos, e especialmente o abuso de crianças".

No dia da visita do Conselho de Segurança, um grupo de adolescentes inquietos e ociosos estava em uma esquina, recontando os horrores que viu.

Um jovem de 18 anos disse que seus pais fugiram, o deixando para trás para cuidar de seu irmão mais novo. Um outro de 20 anos com cabelo bem aparado disse que viu dois homens serem fuzilados enquanto corriam à procura de abrigo. Seu irmão foi morto no mesmo dia, e a mãe dele há dois anos na sua aldeia natal.

Ninguém sabe qual é o número de órfãos espalhados por Bunia e arredores. A missão da ONU daqui já registrou 250 crianças que foram separadas de seus pais; em uma cidade chamada Beni, a 96 quilômetros ao sul, para onde muitos dos moradores de Bunia fugiram durante os combates mais recentes, as Nações Unidas registraram outras 2 mil crianças abandonadas.

A situação ruim das crianças de Bunia não é incomum nesta guerra. O conflito tem atingido duramente seus jovens, os cidadãos mais vulneráveis. Dos cerca de 3,3 milhões congoleses que morreram, a maioria é composta de civis que sucumbiram não por ferimentos de bala, mas por doenças tratáveis, como diarréia e sarampo. As crianças correspondem a uma grande parcela das vítimas.

Mais de 12% das crianças não atingem o primeiro aniversário, segundo estimativas da Unicef. O número de crianças de rua nas cidades congolesas tem aumentado. As aldeias e cidades pequenas estão repletas de jovens desnutridos com barrigas inchadas e cabelo amarelado. Segundo um relatório de 2001 da Unicef, 16% das crianças com menos de 1 ano sofrem de desnutrição aguda.

"A guerra teve um custo enorme sobre as crianças e outros civis", disse a Watchlist on Children and Armed Conflict (lista de irregularidades envolvendo crianças e conflitos armados), uma organização não-governamental baseada em Nova York, que compilou estas estatísticas sombrias em um relatório divulgado em meados de junho. "O Conselho de Segurança da ONU deve pressionar por uma atenção especial à segurança e direitos das crianças nas negociações de paz, pelo fim da impunidade de crimes contra crianças e pelo apoio a programas e políticas que protejam e melhorem as vidas das crianças congolesas, mesmo se o conflito continuar". 
 

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